domingo, 10 de março de 2013

Sobre máscaras e hipocrisia - Nelson Rodrigues - Obra aplicada

A obra de Nelson Rodrigues aplicada às questões da vida.

Sem máscara é muito difícil do indivíduo se aceitar. Tirar constantemente as máscaras – são muitas - é um ato de coragem e é preciso ter vontade, é preciso querer tirá-las. Este é um processo de repensar e transformar os próprios valores. Às vezes achamos mais fácil usar máscara do que nos esforçarmos para esta transformação.

Nelson Rodrigues – ora mal compreendido, ora atacado de má fé e de forma hipócrita – nos deixou com seu trabalho, um material capaz de ajudar muito a realização desta transformação.

"Quando releio Nelson (Rodrigues), não me canso de admirar sua capacidade de, com um mero adjetivo ou expressão, chocar pelo paradoxo, ferir pela ironia, refutar pelo absurdo ou desnudar secretas hipocrisias." (Roberto Campos, na orelha do livro A Cabra Vadia)

O autoconhecimento é o primeiro passo para deixarmos de repetir nossos erros, nossos velhos erros. Aliás, vale lembrar Bertrand Russell que, no mais fino sarcasmo, nos disse que deveríamos deixar de cometer os mesmos erros, já que há tantos erros novos a serem cometidos.

Portanto, como um doente pode ser curado se ele não tem consciência de estar doente? Sem esta consciência ele não procurará tratamento. Da mesma forma uma pessoa não pode transformar seus valores se não tiver consciência de que eles, os valores, estão "doentes".

"De vez em quando, alguém me chama de 'flor de obsessão'. Não protesto, e explico: — não faço nenhum mistério dos meus defeitos. Eu os tenho e os prezo (estou usando os pronomes como o Otto Lara Resende na sua fase lisboeta). Sou um obsessivo. E, aliás, que seria de mim, que seria de nós, se não fossem três ou quatro idéias fixas? Repito: — não há santo, herói, gênio ou pulha sem idéias fixas. (Nelson Rodrigues, no texto Flor de Obsessão, A Cabra Vadia)

"O ser humano é cego para os próprios defeitos. Jamais um vilão do cinema mudo proclamou-se vilão. Nem o idiota se diz idiota. Os defeitos existem dentro de nós, ativos e militantes, mas inconfessos. Nunca vi um sujeito vir à boca de cena e anunciar, de testa erguida: 'Senhoras e senhores, eu sou um canalha'." (Nelson Rodrigues, no livro Flor de Obsessão)

"É preciso ir ao fundo do ser humano. Ele tem uma face linda e outra hedionda. O ser humano só se salvará se, ao passar a mão no rosto, reconhecer a própria hediondez." (Nelson Rodrigues, no site nelsonrodrigues.com.br)

Ainda sobre máscaras e hipocrisia, Nelson Rodrigues traz à tona uma coisa simples do cotidiano, algo tão antigo, mas ao mesmo tempo tão atual e corriqueiro. É o caso daqueles que só lêem as orelhas de um livro e dizem tê-lo lido totalmente. Triste constatação. Se há quem faça isso com questões simples como a dos livros, não há quem faça por outros motivos? Estas são atitudes falsas e que não são sustentáveis. São máscaras postas que não resistem ao tempo. Aqui vale lembrar Lao Tsé no poema 24 do livro Tao Te Ching no qual é dito que aquele que se ergue na ponta dos pés, não pode ficar por muito tempo.

"Acabava de conversar com uma grã-fina, justamente a que lera as orelhas de Marcuse [...] A leitora de orelhas... (Nelson Rodrigues, no texto Uma bica entupida há mil anos; O Reacionário)

"Na vida, usamos máscaras sucessivas e contraditórias." (Nelson Rodrigues, no livro Nelson Rodrigues por ele mesmo, 2012, pág. 261)

"Temos uma bondade frívola, distraída, relapsa. Fazendo as contas, somos bons, por dia, de quinze a vinte minutos." (Nelson Rodrigues, em O Reacionário, 2008, pág. 84)

E por que não falarmos dos casos nos quais colocamos o problema do pão antes da questão da liberdade? Nestes casos, estamos vendendo bens que deveriam ser inegociáveis. Fazemos isso por fraqueza de caráter e por falta de confiança em nós mesmos, dentre outros motivos.

"Sou um obsoleto, um carcomido, porque coloco a questão da liberdade antes do problema do pão." (Nelson Rodrigues, no livro Nelson Rodrigues por ele mesmo, 2012, pág. 249)

"O que confere dignidade à pessoa humana são certos bens inegociáveis." (Nelson Rodrigues, no livro Nelson Rodrigues por ele mesmo, 2012, pág. 259)

"O sujeito, para viver, ou sobreviver, enterra o próprio espírito, como as jóias de Raskolnikov. E, se for preciso, ele finge debilidade mental e põe-se a babar na gravata, copiosamente." (Nelson Rodrigues, no texto Os falsos cretinos; O Óbvio e Ululante)

Muitas vezes Nelson Rodrigues e sua obra foram atacados por aqueles que não gostariam, e não tinham coragem, de ver formas de suas mazelas expostas, pois outros poderiam identificá-las neles. Era preferível atacar a revelação das formas e características de tais mazelas, dos arquétipos, para que tais pessoas não precisassem mudar a si. Aliás, tais mudanças dão bastante trabalho e muitos perderiam com isso, pois à medida que estes arquétipos são revelados, fica mais fácil identificar a sombria interpretação, até porque as verdadeiras intenções ficam mais claras.

"As senhoras me diziam: 'Eu queria que seus personagens fossem como todo mundo'. E não ocorria a ninguém que justamente, meus personagens são 'como todo mundo': - e daí a repulsa que provocavam. 'Todo mundo' não gosta de ver no palco suas íntimas chagas, suas inconfessas abjeções." (Nelson Rodrigues, no texto Os que propõem um banho de sangue; O Reacionário)

"A vaia nada mais é do que o aplauso dos descontentes." (atrib. a Nelson Rodrigues)

"O cinismo escorre por toda parte, como a água das paredes infiltradas." (Nelson Rodrigues, no texto Os cínicos; O Reacionário)


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